Inovação Pessoal: Encontrei um amigo que não via há pouco mais de um mês e notei que ele estava fisicamente diferente. Logo comentei: Você está mais magro. Ele replicou: Fiz lipo. Instantâneamente imaginei um médico introduzindo aqueles dutos aspiradores compridos repetidamente, a dor e a pessoa no pós operatório toda enfaixada com hematomas horríveis. Ele não tinha qualquer sinal de sofrimento e, antes que eu perguntasse, talvez percebendo minha cara de espanto, disse: Passei por um novo procedimento no qual a gordura é previamente derretida e depois absorvida por dutos em apenas pequenos pontos. E acrescenta: Entrei na clínica num dia e sai no outro novinho, ainda fiz preenchimento dessa gordura no rosto e no bumbum!
Parece inacreditável, mas prevejo um futuro em que teremos equipamentos assim em casa, ou ali na esquina, onde entraremos de um jeito e sairemos de outro. Aleluia! Lá se vão todos os nossos aborrecimentos estéticos! A popularização dessa tecnologia nos permitirá alterar tudo o que não nos agrada em nosso corpo. O quanto isso mudaria nossas vidas?
Questiono se o acesso a inovações estéticas trará a desejada sensação permanente de bem-estar. Resolveria o automosáico tira-daqui-põe-ali todos os dilemas de insatisfação pessoal humana?
No dia seguinte assisto a uma matéria do Fantástico com o cantor Lucas Lucco que após passar por uma harmonização facial se olhou no espelho e teve um choque: Não me reconheço mais, não sei mais quem sou, disse o artista. Há meses ele vem passando por um lento processo de reversão do procedimento.
Quantas pessoas conhecemos que passaram por procedimentos radicais para emagrecer, por exemplo, e em menos de dois anos voltaram a engordar? Lembro de outro amigo que estava animado porque ia ao nutricionista e com isso esperava resolver seus impasses com as gordurinhas abdominais, no dia seguinte fui almoçar em sua casa e enquanto ele cozinhava pedi para ver a dieta que lhe foi receitada. Gritei: Aqui diz que você não deve comer arroz branco que é exatamente o que está cozinhando! Ao que ele replica: Eu que não vou deixar de comer meu arrozzinho e muito menos o açúcar que ela mandou cortar do cardápio!
O atalho de se modificar o exterior para preencher algo que falta no interior tem produzido frustração e resultados transitórios. Obviamente, é mais fácil e lógico buscarmos a satisfação através da eliminação daquilo que acreditamos ser o causador do nosso descontentamento, principalmente, se pudermos adquiri-lo em pequenas parcelas que não pesam no orçamento.
Acreditamos que promover a inovação pessoal exterior ou a aquisição de um item, seja ele um estilo de roupa, um eletroeletrônico ou um novo visual, seja o caminho para a sensação de completude – aquele estágio em que nos sentimos integrados como um todo e livres de qualquer sensação de falta.
O fato é que existe uma lacuna eterna criada por nossa mente entre quem somos agora e quem sonhamos ser. Nela projetamos uma imagem ideal de nós mesmos a partir de padrões, modelos, exemplos perfeitos, infalíveis, utópicos e, na maioria das vezes, irreais.
Segundo o psiquiatra Carl Jung e o físico indiano Amit Goswami, sofremos influências do inconsciente coletivo que nos coloca numa constante busca por arquétipos (espécie de padrão ideal compartilhado socialmente) de beleza, amor, justiça, poder, verdade, entre outros.
Além disso, há um sistema de recompensas dentro do nosso cérebro que nos presenteia com uma explosão de hormônios de bem-estar toda vez que vemos ou experimentamos algo pela primeira vez.
O problema não está em buscar, querer, desejar ser melhor, mesmo que esteticamente, isso inclusive é o combustível que alimenta a chama da esperança e produz movimento em nossas vidas, mas em tentar promover a disruptura do eu atual com o eu desejado.
Existe em nossa mente a falsa ideia de que podemos atingir instantaneamente uma mudança radical capaz de nos tornar alguém totalmente diferente da versão anterior. Imaginamos que vamos acordar numa bela manhã e, do nada, seremos tudo o que não éramos na noite anterior. Não há de se falar em inovação disruptiva quando se trata de inovação pessoal.
Na busca por uma versão desvinculada da anterior, praticamos a negação de partes de nós que não gostamos ou que acreditamos serem degradantes, produzindo algo que chamo de fragmentação pessoal.
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A busca incessante por alcançarmos melhores versões tem se baseado na tentativa de apagar traços indesejados de nós mesmos ou deixá-los aos pedaços pelo caminho. Achamos que podemos simplesmente ignorar ou fingir que nunca existiu uma bagagem composta por erros, vícios, experiências e situações vexatórias que formam o histórico de nossa personalidade.
Inovação Pessoal
A verdade é que quem atinge versões inovadoras e consistentes de si mesmo são aqueles que entendem e aceitam o processo de melhoria contínua, enxergando a vida como uma jornada com um destino pretendido, mas composta por cada passo de formiga dado pela estrada.
E essa inovação não é algo que você entra num dia e sai no outro novinho, é um processo que evolui gradativamente. Mais ou menos como observar a grama crescer, enquanto estiver olhando você não percebe mudança alguma, mas quando vira as costas e volta a observar depois de um tempo a diferença é muito clara.
A inovação pessoal ocorre de forma incremental através de práticas simples cujos resultados se mostram cumulativos e permitem, ao se olhar para trás, dizer com satisfação e sem qualquer resquício de culpa: Nossa, como eu estou diferente de quem eu era.